Vivemos em uma sociedade que celebra a juventude como se fosse um bem permanente, uma moeda de valor social. O problema é que, quanto mais esse culto ao novo se intensifica, mais cedo ele começa a excluir. Hoje, não é preciso ter 60 ou 70 anos para ser considerado velho. Aos 30, 35 ou 40, muitas pessoas já se sentem pressionadas a se “atualizar”, “melhorar a aparência”, esconder sinais do tempo e fingir uma juventude eterna. E essa pressão, ainda que disfarçada de autocuidado ou “alto padrão”, é, na verdade, um reflexo direto do etarismo — a discriminação por idade — que está se espalhando para cada vez mais cedo.
O etarismo não afeta apenas quem já chegou a uma idade mais avançada. Ele começa afetando todos os que têm medo de envelhecer. E o medo se manifesta como ataque. Termos como “velho”, “tiozão”, “calvo” ou até “boomer” se tornaram xingamentos comuns — não para descrever alguém de fato, mas como forma de ofensa, de diminuição. São palavras carregadas de frustração, que refletem a ansiedade coletiva diante da passagem do tempo. Pessoas que ainda nem chegaram à maturidade já se preocupam com rugas, com a queda de cabelo, com a perda do “ritmo”. Esse medo é projetado como deboche, exclusão e julgamento contra quem está alguns passos à frente no mesmo caminho.
A consequência é um deslocamento profundo. Pessoas que acumulam experiência, vivências e histórias passam a ser tratadas como ultrapassadas, não por suas ideias, mas pela sua idade. São ignoradas em ambientes sociais, deixadas de lado no mercado de trabalho, desvalorizadas em aplicativos de relacionamento, silenciadas em espaços públicos. Isso gera uma solidão que não é natural do envelhecimento, mas do preconceito com ele. Ninguém nasce isolado — as pessoas são afastadas.
É uma lógica cruel: primeiro se promove o ideal da juventude perfeita como referência de sucesso, saúde e atração. Depois, se abandona quem não consegue ou não quer corresponder a esse ideal. E o mais contraditório é que todos, sem exceção, irão envelhecer. Ou seja, estamos treinando uma geração para excluir a si mesma no futuro.
Enquanto o corpo jovem é visto como ativo, valioso e desejado, o corpo maduro é tratado como um incômodo, como se a sua presença lembrasse a todos de algo que preferem não encarar: o tempo passa. E o tempo, quando negado, volta como crise — individual e coletiva.
Não há nada de errado em querer cuidar de si, manter a saúde ou se sentir bem. O problema está em fazer disso uma régua de validade. Em colocar o envelhecer como sinônimo de fracasso ou perda. Porque o envelhecimento não é um erro — é um processo inevitável, e deveria ser uma conquista, não uma punição social.
Para uma sociedade mais saudável, precisamos parar de tratar a idade como falha e começar a vê-la como parte da vida que merece respeito, voz e lugar.
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